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POSTADO EM 26/07/2021 - 22h08

De Atibaia para as Olimpíadas

Campeão Pan Americano e integrante da seleção brasileira de handebol em Pequim 2008, Sílvio Alvim Laureano fala sobre a incrível experiência de viver um ciclo olímpico

Apoio do professor Ronaldo Bueno (camisa do Santos) quando ainda morava em Atibaia,  foi fundamental no início da carreira de Silvinho

Armando Teixeira Junior

A cada ciclo olímpico o brasileiro descobre que em nosso país de dimensões continentais existem talentos de sobra para os mais diversos esportes. Os atletas que representam o Brasil, no entanto, não raro possuem histórias de superação, e muitas vezes sem patrocínio, lutam por uma medalha nos jogos olímpicos ou apenas para se profissionalizar em modalidades com pouca visibilidade.

Em Atibaia, a trajetória do ponta direita Silvio Alvim Laureano, do handebol não foi muito diferente, desde cedo precisou lutar para conseguir treinar a modalidade que escolheu, e depois, mesmo com muito talento precisou subir degrau por degrau até ser considerado um atleta profissional de alto rendimento. A consagração do trabalho de anos chegou com a conquista do Ouro dos Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro em 2007 e com a disputa das Olimpíadas de Pequim em 2008.

No início, ainda garoto no Colégio Atibaia, encontrou no professor Ronaldo Bueno o apoio que seria decisivo para que seguisse no esporte, ganhou uma bola de handebol e fitas em VHS com jogos gravados para que treinasse em casa o talento ainda bruto.

O amadurecimento veio com o passar dos anos e no auge de sua carreira pôde enfim viver o sonho de fazer parte de um ciclo olímpico.

Para todos que estão atualmente acompanhando as Olimpíadas de Tokio 2020, ele avisa que em muitas modalidades o Brasil ainda não consegue competir de igual para igual com as potências mundiais e que em muitos casos a verdadeira olimpíada para a seleção nacional são os Jogos Pan Americanos, onde o Brasil entra em condições de lutar por medalhas com rivais de níveis mais equilibrados.

De Pequim 2008, apesar de não ter lutado por medalha, o handebolista traz ótimas lembranças, sobre a alegria de viver uma experiência tão especial e das comemorações e festas que agitavam a Vila Olímpica.

Para as crianças e jovens que desde cedo sonham em se tornar um atleta, Silvinho, como ficou conhecido, diz que o importante é não desistir do sonho, mas ao mesmo tempo não deixar de estudar, pois a carreira do atleta profissional é curta e muitos não se preparam para a vida profissional após o término desse ciclo.

Atualmente, Silvinho acompanha com atenção as Olímpiadas de Tokio, em especial o nadador brasileiro Leonardo de Deus um dos atletas com quem ele trabalha - agora como preparador físico e personal trainer.

Confira a entrevista completa.

Como foi o início da sua trajetória esportiva quando ainda morava em Atibaia?

A minha trajetória no handebol em Atibaia foi por acaso, eu e alguns colegas de escola resolvemos formar um time de handebol para disputar os Jogos da Primavera. A gente estudava no Colégio Atibaia e na época só podia jogar futebol de salão quem pagasse uma escolinha e muitos de nós não tínhamos condições ou não queríamos pagar; e aí a gente formou uma equipe de handebol.

Tinha jogador de futebol, de basquete, de baisebol ... e foi assim que formamos essa equipe. E aí, a gente acabou sendo campeões dos Jogos da Primavera, ganhamos de um time muito forte que era a base do time de Atibaia, que era do Aguiar Peçanha. E aí veio o convite do professor Ronaldo Bueno que até hoje trabalha com handebol na Prefeitura de Atibaia. Eu aceitei comecei a treinar handebol pela cidade de Atibaia e ao longo de algum tempo comecei a me desenvolver. O Ronaldo me incentivou a aprender a jogar handebol, me deu fitas de VHS de jogos de seleções do mundo, de olímpiadas, da seleção brasileira. Eu ia treinando com a bola de handebol que ele me deu, não só no ginásio, mas também nas paredes da minha casa. No quintal eu ficava treinando passes e tudo mais, e por incrível que pareça eu consegui me desenvolver tecnicamente brincando na parede.

Quando percebeu que seria de fato um atleta profissional de alto rendimento?

Com todo esse desenvolvimento comecei a jogar alguns campeonatos regionais e eu recebia vários elogios de outros técnicos porque sempre me destacava, fazia muitos gols. Eu sou canhoto e isso me destacava, porque era muito difícil um canhoto no handebol. Então, com esses elogios e incentivos externos eu comecei a me fortalecer com essa vontade de tentar ser atleta de handebol. Foi um sonho que começou quando eu aprendi a jogar handebol com 16 para 17 anos, eu estava no colegial e foi crescendo essa vontade, até que um dia eu recebi um convite para jogar na equipe de Americana, que já disputava Campeonato Paulista, Campeonato Brasileiro e que naquele ano havia sido terceiro colocado na Copa do Brasil de handebol, o que era um grande feito. Fiz um teste lá e acabei passando, fui morar em Americana, onde joguei por quatro anos. Eu me considerava um atleta semiprofissional naquela época porque eu não recebia um salário muito bom. A equipe não tinha uma estrutura profissional. Mesmo assim eu fui me desenvolvendo mais ainda tecnicamente, até que no final do ano de 2004, quando eu tinha me tornado vice-artilheiro do campeonato paulista e um dos artilheiros da liga nacional, recebi um convite para jogar pelo São Caetano. O técnico do São Caetano já havia sido técnico da seleção brasileira e a equipe era a campeã da liga nacional. Aí sim, eu me senti um atleta profissional de handebol de alto rendimento.

Como foi sua primeira convocação para a seleção brasileira de handebol?

Nessa época, pós Olimpíada de Athenas, a equipe de São Caetano tinha vários jogadores que participaram das Olimpíadas pela Seleção Brasileira e outros atletas que haviam participado de outras convocações para Mundial, Pan-americano... Nesse momento eu me via como um atleta de alto rendimento com condições de vestir a camisa da seleção brasileira e quem sabe brigar por uma vaga para disputar os jogos olímpicos e os jogos Pan-Americanos.

A minha primeira convocação para a Seleção Brasileira se deu em 2006, um ano depois de eu ter me transferido para São Caetano. A Seleção Brasileira tinha um novo selecionador que era o espanhol Jordi Ribeira, hoje treinador da Seleção Espanhola de Handebol, atual campeã europeia, atual terceira colocada do mundo, considerado um dos melhores treinadores do mundo. Ele me convocou para um desafio internacional contra Cuba que foi realizado em Guarulhos. Eu já estava sendo considerado integrante da Seleção Brasileira e do Ciclo Olímpico que são os quatro anos após a última olimpíada, e com o Pan-americano que ia acontecer no Brasil e era classificatório para as Olimpíadas.

E a emoção de ganhar a Medalha de Ouro nos Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro?

Os Jogos Pan-americanos do Rio são considerados para o handebol brasileiro, "a nossa olimpíada", porque para conseguir uma medalha olímpica o Brasil tem que trabalhar muito o desenvolvimento do handebol internamente. Ser campeão Pan-americano é a nossa olimpíada, é a classificação para a Olimpíada em si, então participar dos Jogos Pan-americanos é o sonho de qualquer atleta do handebol brasileiro, porque abre as portas para jogar uma Olimpíada.

O legal é que nesse Pan eu fui eleito o melhor ponta das Américas, fui o melhor jogador no jogo Contra Cuba, um jogo no começo disputado, depois a gente abriu e ali sim eu me senti no auge da minha carreira. Durante esse ano eu fui o melhor ponta direita da liga nacional também, então estava tudo certo para estar entre os nomes iriam para Pequim.

Como foi a final contra a Argentina?

A Argentina é em tudo uma grande adversária nossa, a gente tinha uma grande disputa com eles, uma rivalidade aflorada no mundial anterior, na Alemanha, onde nossa equipe perdeu para a Argentina e rolaram muitas provocações. Antes disso vencemos o Campeonato Pan-americano de Seleções contra eles, então a disputa e a rivalidade cresceram muito, e depois dessas provocações no mundial a gente falou que não ia perder e não perdeu.

O jogo foi bem disputado no primeiro tempo, depois o Brasil e passou no placar e não perdeu mais. No fim rolou briga porque eles, como sempre, não gostam de perder. Enfim, foi um jogo muito acirrado, com muita violência, mais do que o handebol proporciona, mas foi lindo. Ser campeão em cima da Argentina é sempre bom.

Falando de Olimpíadas, quando você começou a sonhar com a possibilidade de um dia representar o Brasil no principal evento esportivo do mundo?

A Olimpíada é o sonho de todo atleta, como a Copa do Mundo é o sonho para o jogador de futebol. O meu sonho olímpico, nossa ele se deu depois de assistir a primeira Olimpíada que eu me lembre que foi a de Seul em 1988 e também depois de assistir “Carruagens de Fogo”. Esse filme é fantástico, ganhou Oscar, aí eu senti um pouco daquela gana de participar.

Eu venho de uma família de esportistas, meu pai nascido em Atibaia, conhecido como Chico Morfiga era um atleta, o meu tio Antônio Carlos Laureano que deu o nome ao Complexo Esportivo Elefantão foi um esportista, então eu tenho o esporte na minha veia, a Olimpíada era um sonho.

Como foi a experiência em Pequim 2008? O nível da competição era muito alto naquela edição?

Pequim foi o sonho realizado, é um mix de tudo, de experiência esportiva, experiência festiva, experiência de tudo que um atleta pode ter, ele encontra nas Olimpíadas, as melhores experiências do mundo.

O nível da competição é sempre alto, são os melhores atletas em todas as categorias, no handebol em si a gente via e jogou com nossos ídolos, na época o handebol foi para tentar se classificar, a equipe não se classificou, nós ficamos em décimo lugar, conseguimos vencer apenas a China, fizemos dois jogos ruins contra a França e Croácia, fizemos um jogo ótimo contra a Polônia e quase ganhamos e fizemos um jogo excepcional contra a Espanha que definia se a gente ia para as quartas de final, e nós perdemos apenas por um gol. O placar foi alto, foi gigante, foi 37 a 36, foi um jogo fantástico, mas infelizmente não conseguimos classificação, mas ficou aquele gostinho de que a gente fez o nosso papel, o papel que nós poderíamos fazer naquela época.

Conte para nós o que você mais gostou dos dias passados na Vila Olímpica. O que acontece quando os atletas não estão treinando ou jogando? Como eram as instalações e o contato com as outras delegações?

Quando a gente estava em período de competição e não estava treinando a gente descansava, passeava pela vila, essas coisas assim, agora depois que fomos desclassificados a gente pôde fazer outras coisas, aproveitar a cidade de Pequim, fazer compras, participar de festas privadas onde só podiam entrar atletas. Muito merecido depois de quatro anos de trabalho. As instalações de Pequim eram fantásticas, a China naquela época queria mostrar sua grandeza para o mundo, então construiu estádios fantásticos, a instalação da vila olímpica era fantástica, era uma coisa linda, maravilhosa.

Em Pequim, você pôde acompanhar como expectador outros esportes?

Durante a olimpíada nós pudemos assistir outros esportes, eu fui assistir o Brasil perder para a Argentina na semifinal do futebol, com show do Messi, eu vi a Seleção Brasileira de Voleibol feminino ser campeã olímpica em cima dos Estados Unidos, pude assistir o César Cielo ganhar medalha de ouro, assisti bastante handebol, foi uma experiência fantástica, fizemos muita festa, Olimpíada é uma festa e foi muito bom.

Infelizmente muitos esportes são pouco reconhecidos no Brasil, o handebol é um dos que têm pouca visibilidade. Na sua opinião falta incentivo para que surjam mais atletas de diferentes modalidades?

O handebol teve muita visibilidade na minha época, principalmente porque o basquete vinha de um momento de baixa visibilidade devido à falta de classificação para as Olimpíadas. O handebol perdeu a oportunidade de ser o novo basquete. A gente tinha muita visibilidade, a ESPN Brasil transmitia os jogos das equipes, inclusive a Globo transmitia jogos da Seleção Brasileira, mas aquela mesma tônica, o incentivo, a corrupção na confederação, tudo de podre que acontece na política acontece no esporte também, então é esperado que num momento de baixa quando o esporte não está em alta, como no pós-olimpíada, essas coisas fazem com que o incentivo diminua, então falta dinheiro para investir no desenvolvimento dos atletas.

Qual sua expectativa para o desempenho do handebol brasileiro em Tokio 2020?

O desempenho do Brasil em Tokio acredito que no masculino o Brasil não se classifique, é uma chave muito difícil, apesar de termos jogadores que jogam na Europa, inclusive temos dois jogadores que jogam no melhor time do mundo que é o Barcelona, mas é muito difícil. As equipes europeias são muito boas, existe uma diferença muito grande dos jogadores europeus para os brasileiros. O treinador brasileiro é muito aquém do cargo dele. No feminino as meninas estão mais consolidadas no mundo, então eu acredito que elas lutem para tentar chegar na medalha, uma disputa de semifinal, até quartas de final. O processo de renovação da seleção feminina tem acontecido, a equipe é muito boa.

Qual mensagem você deixa para jovens e crianças que sonham um dia representar o Brasil em uma Olimpíada?

O recado que eu deixo para as crianças e para as pessoas que querem disputar uma Olimpíada, é que persistam, que sigam seus objetivos, que não se deixem desviar desses objetivos porque o caminho é difícil, fazer esporte no Brasil é muito difícil, então desistir é muito mais fácil do que prosseguir, eu acho que realmente quem consegue chegar lá em uma modalidade que não tem tanta divulgação é um guerreiro e merece estar lá porque se dedicou ao máximo naquela fase que ninguém estava de olho, então persistam, lutem pelos seus sonhos e não deixe que nada atrapalhe o objetivo de vocês.

Ainda assim, não deixem de estudar, não deixem de ter uma profissão, porque ser atleta no Brasil é muito difícil e tem “prazo de validade” e depois que esse ciclo acaba é necessário estar pronto para o mundo real.

Atualmente Silvinho é proprietário de uma empresa de preparação física para jogadores de futebol, preparador físico de atletas de outras modalidades, como o nadador Leonardo de Deus que disputa as Olimpíadas de Tokio 2020, e personal trainer.

Contatos:
Empresa de futebol: @consagre_performance
Instagram: @alvim01
Telefone: 11 98695 2427

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